Gostava de passear com o cachorro sempre àquela hora, não porque o clima do entardecer era mais agradável ou o trânsito menos barulhento, mas por causa de uma garota de cabelos loiros que, dia sim dia não, esperava um ônibus no ponto da esquina.
Na primeira vez que a viu, quase não conseguiu desviar o olhar. Ela tinha as pernas cruzadas com elegância, os olhos esverdeados fitos no horizonte e os cabelos presos num rabo-de-cavalo. Havia certo erotismo velado naquela pose, ele tinha certeza. Sempre que passava em frente àquele ponto, o garoto demorava mais que o normal e deixava seu cachorro á vontade para vasculhar o mato enquanto apreciava, discretamente, seu amor platônico. Não sabia quem ela era, pra onde ia todas as noites ou onde morava.
Certo dia tentou uma aproximação. Levou a carteira, que normalmente deixava em casa, e a colocou no bolso de trás da calça jeans, pronta pra cair a qualquer toque. Quando passou em frente à parada de ônibus, fingiu uma ajeitada no bolso e deixou a carteira cair, sem olhar pra trás. Por um momento pensou que ela não tinha visto, ou que não iria falar, mas continuou andando, cheio de esperança.
— Ei... Sua carteira caiu. — Disse a garota, finalmente. Ele se virou, o rosto vermelho, o coração acelerado, e pegou a carteira do chão.
— Nossa, obrigado! Eu sou muito distraído. — Disse ele, meio no susto, meio no ensaio. E nos cinco segundos mais mágicos de sua vida, ela sorriu. Seus lábios carnudos se movimentaram com delicadeza até salientar duas covinhas no rosto. O mundo parecia se debruçar sobre o charme daquela garota.
Na outra semana, ele foi ainda mais ousado. Desta vez não desceu com o cachorro. Foi sozinho e perfumado e sentou-se ao lado dela na parada. A idéia era pegar o mesmo ônibus (seja lá qual fosse) e poder passar pelo menos mais vinte minutos ao seu lado. Enquanto esperava o transporte, nenhum dos dois quebrou o silêncio. De vez em quando ele lançava olhares furtivos pelo canto do olho, mas ficava só nisso.
Já estavam ali há trinta minutos, as principais linhas já tinham passado e nada da garota se manifestar. Foi quando um carro amarelo, com um som infernal parou ao lado deles. A garota se levantou, sentou no banco do carona e beijou o motorista. O garoto, decepcionado, ficou sentado na parada, esperando um ônibus que nunca chegaria.
6 de julho de 2009
Um comentário:
Um clássico!
Da vida de muitos meninos :(
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